O episódio Discovery Channel

O Discovery Channel é um logro. Assistia eu no outro dia a um programa deste canal (Columbus: Secrets from the Grave), que por sinal passava na RTP2, quando cheguei a esta conclusão. O programa era sobre Cristóvão Colombo. O herói. O descobridor. O aventureiro. Ele próprio aparentemente também um logro.









(o logótipo do embuste)

Factos: Cristóvão Colombo tropeçou na América convencido de que estava na Índia. Daí os nativos terem sido designados por "índios". O tipo morreu convencido que tinha efectivamente descoberto uma alternativa marítima até à Índia. Esta viagem e iniciativa foram patrocinadas pela coroa Espanhola, uma vez que Cristóvão teria levado uma tampa da corte Portuguesa, que não estaria interessada nesta demanda porque de acordo com alguns historiadores, entre outras razões, já se sabia da existência daquela massa de terra depois do Atlântico, além de que o "melhor" caminho seria o de Vasco da Gama dobrando o Cabo da Boa Esperança (antigo Cabo das Tormentas).
É sabido que a corte Portuguesa naquele tempo teria a colaboração de alguns dos melhores cartógrafos do planeta, o que ajuda na tomada de determinado tipo de decisões. Exemplo disto é o famoso Tratado de Tordesilhas (1494), em que Portugal e a Espanha repartem entre si o mundo desconhecido. Os portugueses curiosamente ficam com alguns pedaços de terra francamente interessantes (o Brasil por exemplo) em particular no que diz respeito a recursos naturais, situação geográfica, etc. O que fizemos com eles é outra história.














(ilustração com brasão português da época)

Ora bem, Cristóvão Colombo, o “descobridor logro”, é hoje em dia o navegador que mais fama e proveito terá colhido com ao decorrer do tempo (muito por culpa dos americanos que frequentemente são uns deslumbrados e ocasionalmente pouco rigorosos - ainda recentemente tivemos o episódio "weapons of mass destruction in Iraq...").
É curioso como “lograr” em espanhol significa “conseguir”. Colombo realmente “conseguiu” até enganar-se a si próprio. Quais Vasco da Gama, Fernão Magalhães, Pedro Álvares Cabral e Bartolomeu Dias... Esses infelizmente não "descobriram" a América. E os maus historiadores, professores e estudantes, com o decorrer do tempo, encarregaram-se da campanha de marketing em prol de Colombo.






















(Cristóvão Colombo)

Mas o programa do Discovery Channel não questionava nada disto. Centrava-se na questão e consequente investigação, se Colombo seria realmente Genovês ou... Catalão de Barcelona! Bom, parece que analisando a sua caligrafia, alguns factos da sua vida pessoal e análises de DNA das ossadas do seu filho, bem como das suas (que não deram em nada), se concluiu que Cristóvão Colombo "poderia" ter sido Catalão. Óptimo para ele, Barcelona é mais bonita e interessante que Génova. Esta parte do programa não questiono - aliás pode ser que com sorte daqui a uns anos venham a redescobrir que o senhor como navegador e descobridor não era grande espingarda e que havia melhor por aí.














(o mapa acima não corresponde ao que foi apresentado no programa, mas é retirado do website do Discovery Channel e também padece de falta de rigor: Sevilha fica algures em Sagres!)

O que me incomodou foi o facto de, referindo-se variadíssimas vezes a Portugal, às disputas entre coroas, ao facto de Colombo ter dado uma vez à costa de Portugal depois de se atirar de uma caravela, de ser casado com uma mulher da nobreza portuguesa (dos Açores), tenham mostrado mais do que uma vez um mapa da Europa (centrado na Península Ibérica) supostamente retratando a época (séc. XV/XVI), em que ao lado da França surge uma legenda que diz "Spain", e mais nada! Onde está Portugal?!

Ora na altura nem a "Spain" era bem a Espanha (havia reinos e regiões à estalada entre si), como já há muito existia um rectângulo chamado Portugal (Olivença nesse tempo se calhar ainda era nossa?!), sendo hoje Portugal o país Europeu que há mais tempo tem as suas fronteiras estabelecidas e delimitadas.
Esta dessincronização, lapso ou falta de rigor é tão cretina que a partir daí questiono até que ponto é que o programa a que estou a assistir não padecerá do mesmo mal?

















(para os distraídos, Portugal é o "rectângulo" à esquerda!)

Parece que sempre que vejo programas de história, ou filmes com um fundo e contexto históricos, Portugal e os portugueses ou são eliminados e esquecidos, simplesmente ignorados ou pior mal retratados. Das duas uma: ou a história de Portugal que nos ensinam cá não corresponde à verdade, ou o resto do planeta há muito que é vítima entre outras coisas de falta de rigor e marketing enganador de alguns. A mim chateia-me porque além de apreciar algum rigor histórico, geográfico e científico nestas coisas, também sou português.